A Reconstrução do Passado:  uma análise crítica do artigo “As Três Ecologias”, de Felix Guattari




A análise abaixo é sobre o livro As Três Ecologias, de FÉLIX GUATTARI.

É recomendada a leitura do livro. Se quiser, faça download abaixo:

+ Clique e faça Download do livro As Três Ecologias,d e Félix Guattari (em PDF)


A Reconstrução do Passado:  uma análise crítica do artigo “As Três Ecologias” de Felix Guattari

 por Francisco Arquer Thomé

Baseando-se na análise sobre as condutas atuais das relações sociais (socius), do meio ambiente (natureza) e de uma subjetividade psicanalítica (psique), Felix Guattari disserta os melhores métodos de administrar a  vivência através do que ele chama de “ecosofia’, em seu artigo “As Três Ecologias”. Esta “articulação ético-política”, como é denominado, integra a ascensão tecnológica e o fundamentalismo ideológico à expectativa do autor por uma organização política e social.

O mundo possui uma construção histórica enraizada numa luta bipolar, durante os séculos passados era notável os confrontos entre duas distintas formas de comando organizacional, a exemplo o leste e oeste, as classes operária e burguesa, Deus e Diabo e o bem versus o mau. Guattari explicita que a dualidade vivida “contribuiu para forjar campos homogêneos bipolarizados de subjetividade, (…) e uma mesma camada imaginária se encontra agora chapada sobre o conjunto das posições subjetivas.” O antagonismo, além de ser explicitada através da lógica pré-objetal e pré-pessoal numa análise psicoanalítica freudiana, é ainda notável na atual forma democrática de administração, pois há uma extrema desigualdade social que gera uma marginalidade dos países em desenvolvimento, eufêmico 3º Mundo, através da “hiperexploração” dos Estados Desenvolvidos. Mesmo com a indução incolor da mídia à subjetividade normalizada, as reivindicações nacionalitárias crescem e despontam uma nova realidade maniqueísta, em que o xenofobismo aos países desenvolvidos e a ascensão social da mulher são exemplos.

O controle da mídia por uma uniformização das condutas sociais e psicológicas da população é um dos maiores empecilhos para o desenvolvimento e reinvenção da ordem democrática. “Indo no sentido de uma re-singularização individual e/ou coletiva, ao invés de ir no sentido de uma usinagem pela mídia.”

Mesmo com a re-disseminação da bipolaridade, há uma constante colocação para que o ser humano torne-se um individualista funcional. Esta imposição tende a afastar uma noção real ao subjetivismo, levando, os poucos que se arriscam a compreendê-lo, a uma paralela crítica com as análises científicas já existentes. Guattari propõe a urgência em “desfazer-se de todas as referências e metáforas cientistas para forjar novos paradigmas que serão, de preferência, ético-estéticas”, havendo grande ênfase à homogeneização das necessidades sociais.

Para Felix Guattari, as pessoas vivem através de construções sociológicas ultrapassadas, em que os módulos de subjetividade são enraizadas a um arquétipo que não mais condizem com a realidade atual. A necessidade de re-orientar os conceitos através de Sigmund Freud ( princípio efetivo da ecologia mental e o processo primário), Jung e Lacan faz-se necessária, pois a edificação de estereótipos tradicionais traz apenas um fortalecimento para que o “inconsciente permaneça agarrado em fixações arcaicas, (…)  nenhum engajamento o faz projetar para o futuro.” Esta projeção psicológica necessária é vinculada à construções administrativas fundamentais, como a educação, a saúde, a cultura, o esporte, a arte, a mídia e a moda entre outros.

Através da análise do registro das práticas “psi” de Guattari, o desenvolvimento da subjetivação dá-se através de um processo evolutivo e inovador que desvaloriza a constante  repetição.“Tudo deveria sempre ser reinventado, retomado do zero, do contrário os processos se congelam numa mortífera subjetivação”.

O desenvolvimento tecnológico e as modificações naturais conflitam diretamente com a estabilidade que a natureza instaurou há anos, levando a espécie humana a uma nova orientação evolutiva. A necessidade de adaptação faz-se necessária, já que o processo das revoluções informáticas, robóticas e genéticas impõe uma seleção natural ecossistêmica completamente vinculada ao meio social e ao regrismo mecanosférico.

            De acordo com o autor, nos séculos passados, a religião e a arte completaram um grande vácuo existencial através da denotação ambígua de significados, preceituando-os como refúgio das “cartografias” existenciais. Na época atual, há o surgimento de um vazio na subjetividade que tende a se proliferar. Vinculado a esta multiplicação, os progressos culturais e sociais entram em degradação, abrindo espaço para a estrutura da produção de bens de serviço e produtora de signos, sintaxe e de subjetividade através do controle que o capitalismo exerce sobre os meios de comunicação.

A marginalização do pensamento, em relação às condutas que deveriam ser tomadas, transforma a ecologia social numa vertente com pouca significância através da construção moderna, levando os agrupados militantes de causa a uma posterior dissipação. “Todos e todas serão conduzidos a fixar objetivos comuns e a se comportar ‘como soldadinhos’(…), ao mesmo tempo, momentos de ressingularização onde as subjetividades individuais e coletivas ‘voltarão a ficar na delas’.”  Guattari elabora um ponto com duas vertentes para o desenvolvimento da ecologia social, que diz respeito a um investimento afetivo e pragmático em grupos humanos. Uma delas é formação da personalidade através do convívio microsfera familiar, e o outro é a simbolização de um líder como busca de identidade.

O autor trabalha com o declínio desregrado da formulação ideológica e subjetiva, e afirma que tal direcionamento é feito por causa da dependência que os meios de comunicação possuem e sua manipulação. A comparação entre a quantidade de informações propagadas há menos de cem anos com a velocidade em que o conhecimento globalizado é difundido nos dias atuais, é notável que haja um maior pluralismo de informações vinculadas pela mídia do que uma lateralidade sem necessidade. A progressão geométrica com que a informação é propagada pelo planeta, através da mídia, destitui a necessidade de uma afirmação sócio-psicológica dentro da bipolaridade, pois a heterogeneidade dos Seres Humanos e a amplitude no acesso ao conhecimento pode até ser manipulado nos dias atuais, mas traz o afloramento do “desenvolver com exclusão”, em que as ideologias não mais aplicadas ao mundo pós-moderno se extinguem.

Nota-se que a ideologia de Guattari, em seu artigo “As Três Ecologias”, é antagônica pois, ao mesmo tempo em que ele se baseia numa suposta modificação doméstica, concluindo que reinventar os moldes tradicionais não seria possível,  e sim desenvolver uma experimentação afetiva e intelectiva nos níveis micro e macro-sociais seria o novo patamar para o desenvolvimento e “salvação” do socius e do meio ambiente, o autor também defende a formação de grupos não-funcionais, ser-em-grupo, baseando-se na construção familiar, contestando e desfavorecendo a individualidade dos dias atuais através das intervenções “comunicacionais”. A experimentação afetiva e intelectiva em nível globalizado é conseqüência da multiplicação e proliferação do conhecimento ao redor do mundo, e isso se dá através da ampliação da mídia. Os recursos técnicos-científicos, por mais que haja uma indução e imposição que visa seu controle, são propagadores de desenvolvimento social e cultural. A subjetiva união que ela propõe é muito maior do que se era notável há menos de um século, pois, na época atual, um maior número de pessoas possuem a liberdade de racionalizar, por exemplo sobre a construção da bipolaridade. Já no suposto desenvolvimento psicanalítico, a adaptação à analise freudiana sobre a realidade não supera uma mera ficção, é uma construção futurista se considerado o tradicionalismo social enraizado e os padrões psico-históricos em que o mundo técnico-científico se edificou.